Nem causos, nem contos e nem lendas. Essencialmente história é
o que nos revelou o escritor João Simões Lopes Neto (1865-1916) quando, entre 1911 e 1912, publicou a “Revista do 1º Centenário de Pelotas”. O autor de “Causos do Romualdo”, “Contos Gauchescos” e “Lendas do Sul”, lançou a revista para as comemorações dos cem anos de fundação de Pelotas. Ele destacou o marco inicial: a criação da freguesia (distrito) de São Francisco de Paula, em 7 de julho de 1812. O território era parte do 3º distrito (Cerro Pelado) do município de Rio Grande e tinha por limites o Canal São Gonçalo, a Lagoa dos Patos, o Rio Camaquã e o “centro da Serra dos Tapes”, que o dividia da recém-criada freguesia de Canguçu. Mas além de relacionar fatos e personagens marcantes da história pelotense, Lopes Neto também escreveu sobre Canguçu e São Lourenço. Um trabalho publicado pelo professor Eduardo Wilhelmy, em 1905, pode ser apontado como a primeira resenha histórica de Canguçu. Quanto a São Lourenço, cremos que esta primazia coube a Lopes Neto. AS ORIGENS Tal como Pelotas, São Lourenço tem origem no século 18, nas estâncias das terras planas entre a Lagoa dos Patos e a Serra dos Tapes, ocupadas por militares luso-brasileiros. O registro mais antigo é de 1785, quando a Estância São Lourenço está na posse do capitão-mor Manoel Bento da Rocha. Até o início do século 19, documentos citam o “Distrito de São Lourenço”, depois “Distrito do Boqueirão”. Lopes Neto, porém, começa sua narrativa muito depois, na data de 11 de dezembro de 1830, quando a freguesia de Pelotas é dividida e surge a freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Boqueirão. Omite, no entanto, a lei de 7 de abril de 1832, que cria o município de Pelotas, tendo Boqueirão como 3º distrito. Em seguida, o escritor lista uma série de leis de desmembramento do território, como a de 26 de abril de 1884, que criou o município de Boqueirão, limitado pelo Arroio Correntes, Canguçu, Lagoa dos Patos e Rio Camaquã; e a de 28 de junho de 1889 que extingüiu Boqueirão e o incorporou ao novo município de São João da Reserva, que nem foi instalado em virtude da Proclamação da República. LUTAS POLÍTICAS Nas leis referidas por Lopes Neto, vê-se que desde 1861 houve um esforço para que São Lourenço fosse sede distrital e se emancipasse. É o caso da lei que criou a freguesia de São Lourenço (4º distrito de Pelotas), em 29 de abril de 1876, de autoria do deputado liberal Saturnino de Arruda. Frise-se que por muitas décadas o confronto de políticos conservadores e liberais barrou o progresso e a autonomia de São Lourenço. Durante e após a Revolução Farroupilha as facções políticas definiam o impasse: no Boqueirão, os Vieira Braga e os Gomes de Carvalho, conservadores/monarquistas; em São Lourenço os Abreu e os Guimarães, liberais/republicanos. A autonomia só veio com o fim da Monarquia. Assim, em 15 de fevereiro de 1890 - sem o voto do povo - um ato de gabinete do governo republicano do Estado criou o município de São Lourenço, tendo como 2º e 3º distritos, Boqueirão e Reserva. Lopes Neto era um vibrante republicano mas escreveu com espírito isento, talvez até para não reavivar memórias das divergências que levaram à Revolução de 1893-1895, quando a luta política vitimou mais de dez mil gaúchos. O FUNDADOR Lopes Neto destaca que o fundador de São Lourenço foi José Antônio de Oliveira Guimarães, o qual foi vereador por Pelotas de 1861 a 1864. Pelo Partido Liberal, é claro. Por volta de 1850 ele destinou “um oitavo de légua” de sua Estância São Lourenço “para a fundação de um povoado”, junto ao porto de sua charqueada. A idéia partiu de seu amigo Domingos José de Almeida, o super-ministro farroupilha, que em 1844 fundara a cidade de Uruguaiana. Por volta de 1860 Guimarães mandou construir a primeira capela, frente à atual praça central, e comprou a imagem do mártir São Lourenço. A COLÔNIA Na mesma em carta que sugeriu a fundação de uma povoação junto ao Rio São Lourenço, Almeida propôs a fundação de uma colônia na Serra dos Tapes. O projeto que obtivera êxito em diversas regiões do Estado, tivera em Pelotas uma série de fracassos. Guimarães assumiu a nova proposta e, conforme Lopes Neto, em 15 de março de 1857, assinou em Rio Grande um contrato de sociedade com Jacob Rheingantz formando a empresa “Colônia de São Lourenço”. A importante participação de Guimarães é omitida em dois históricos da Colônia, um publicado em 1907, por um filho de Rheingantz, e o outro em 1957, por um escritor contratado pela família Rheingantz. As duas versões ocultam muitos fatos importantes, como o de que a maioria dos primeiros imigrantes, vindos em janeiro de 1858, acabaram indo para Pelotas, São Leopoldo e Santa Cruz. A situação tornou-se tão dramática que Guimarães, ao final do prazo contratual de 5 anos, abandonou a sociedade. A CÃMARA Com referência à vida política de São Lourenço Lopes Neto registra o advento da República, com a posse e ação da Junta Provisória de governo. Em 7 de março de 1890 temos o registro da primeira ata da “Câmara Municipal da Vila de São Lourenço”, com as assinaturas dos cidadãos Carlos Otho Knüpppeln e Ignácio dos Santos Abreu, “administradores provisórios dos negócios municipais”. Mais tarde, a 23 de abril de 1890, transcorre a solene inauguração do prédio da Câmara Municipal. Por fim, além de citar o início das atividades de um estaleiro, Lopes Neto enumera nomes dos primeiros conselheiros (vereadores) municipais e do primeiro intendente: o fundador da cidade, coronel José Antônio de Oliveira Guimarães, empossado em 18 de outubro de 1892. João Simões Lopes Neto, como dissemos, escreveu com absoluta isenção política. E mais: sem paixões, sem obrigação de agradar quem quer que fosse. Por isso, seus artigos históricas são definitivos, esclarecedores. Ele não foi um animador de auditório a contar absurdos como se história fosse; nem lançou teses exdrúxulas para agradar governantes de plantão. Lopes Neto foi um hisoriador honesto, além de escritor brilhante. Foi, aliás, o primeiro historiador de São Lourenço.PEDRO HENRIQUE CALDAS Historiador, membro do Instituto Históricoe Geográfico de Pelotas – IHGPelFonte: LOPES NETO, João Simões. “História de Pelotas”. Organizador: Mário Osório Magalhães Pelotas, Ed. Armazém Literário, 1994. Fotos: Simões Lopes Neto Primeira Câmara Municipal de São Lourenço, inaugurada em 23 de abril de 1890 A segunda igreja de São Lourenço numa imagem de 1909 http://www.ihtrgs.com.br |
sábado, 4 de agosto de 2012
SIMÕES LOPES NETO E A HISTÓRIA DE SÃO LOURENÇO
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