quarta-feira, 15 de abril de 2009

Mães na Argentina se mobilizam contra o paco, a "droga dos pobres"

Le Monde
Christine Legrand
Nessa quinta-feira (dia 26), em Buenos Aires, elas são em torno de cinquenta na praça de Maio, em frente ao palácio presidencial. Elas usam um lenço preto na cabeça em sinal de luto. Elas denunciam a devastação decorrente do "paco", uma droga barata, que mata seus filhos às dezenas. Por uma questão de horas, elas poderiam ter encontrado as Mães da Praça de Maio, com seus lenços brancos na cabeça, que todas as semanas há 30 anos fazem manifestações pelos seus filhos desaparecidos durante a ditadura.

"Eu não as conheço pessoalmente, mas foi seu exemplo que me deu coragem para lutar", explica Rita Diaz. Juntamente com outras mães de diferentes bairros pobres, ela protesta todas as quintas-feiras, desde 8 de janeiro. Essas mulheres pedem para ser recebidas pela presidente Cristina Kirchner. "Queremos falar de mãe para mãe", explica Rita.

Para pedir por políticas de prevenção e reabilitação, elas criaram, em 2004, uma associação chamada "Hay otra esperanza" (Existe outra esperança). Elas se opõem a qualquer descriminalização do consumo da droga. Elas não hesitam, se julgarem necessário, em levar elas mesmas seus filhos toxicômanos diante de um juiz para que eles sejam internados.

Graciela Izquierdo se esgoela em um megafone sob o olhar espantado dos turistas. "Nos anos 1970, os militares mataram uma geração de jovens, e ninguém disse nada", ela grita. "Hoje, a sociedade assiste, sem dizer nada, a um genocídio silencioso de jovens argentinos, aceitando o domínio dos traficantes de droga".

O paco apareceu durante a crise financeira de 2001. A Argentina naufragava, e junto com ela, uma parte da classe média. O paco - mistura de cocaína, vidro moído, querosene, produtos químicos e até raticida - custa 5 pesos (menos de R$ 3) a dose. "Ele age em poucos minutos, destrói os neurônios em seis meses e provoca uma dependência mais forte que o álcool ou a heroína", explica Ignacio O'Donnel, sociólogo que trabalha em seis favelas de Buenos Aires.

"Poucos conseguem sair dessa", ele diz. "Em caso de abstinência, muitos se suicidam, geralmente por enforcamento". O sociólogo acaba de voltar da favela de Retiro, no centro de um bairro chique de Buenos Aires. "Foi o enterro de um garoto de 15 anos, morto por um traficante a quem ele não conseguiu pagar", ele conta.

Quinze quilômetros a oeste da praça de Maio, fica a Ciudad Oculta, uma das maiores favelas da capital, com 30 mil habitantes. Na madrugada de 21 de março, uma operação policial levou à detenção de sete traficantes e à descoberta de dois laboratórios que serviam para fabricar o paco. Essas "cocinas" (cozinhas) se multiplicam nas favelas.

Foi em Ciudad Oculta que nasceu, em 2003, o primeiro movimento das "Mães contra o paco", presentes hoje nas principais favelas. Ao contrário das mulheres que protestam na praça de Maio, elas são partidárias da descriminalização do consumo da droga. Mas elas também pedem por programas de prevenção.

A raiva de Vilma Acuña é mais forte do que as lágrimas que afloram dos olhos dessa mãe de 47 anos. Ela tem seis filhos, que criou sozinha. Um deles, David, foi assassinado porque foi testemunha involuntária de um acerto de contas entre traficantes. Ele tinha 16 anos.

Com a sua morte, seu irmão mais velho Pablo se afundou no paco. Para comprar a droga, ele vendeu tudo que tinha, e roubou. Sua noiva, grávida, o deixou. Aos 26 anos, Pablo é um esqueleto. Ele dorme o dia inteiro e só acorda para comprar paco. "É a única forma de não sentir mais nada, de não chorar", ele resmunga.

Sua história é igual à de centenas de jovens dos bairros pobres. "Eles não têm futuro", diz Vilma, que prevê que a crise só acentuará essas exclusões sociais. Em uma das ruelas de Ciudad Oculta, ela mostra "a esquina da morte": cerca de vinte garotos fumam paco a 100 metros de uma delegacia.

Entre 2001 e 2005, o consumo aumentou 200%, segundo os números oficiais. São mais de 150 mil jovens consumidores. Alguns começam aos 7 anos de idade.

Sendo agora um momento em que a insegurança é a principal preocupação dos argentinos, Vilma se enfurece quando a imprensa associa o paco a episódios de violência. "É absurdo", ela grita. "O consumidor de paco é um zumbi, um morto-vivo. Se ele rouba para comprar droga, ele o faz dentro da favela. Ele não tem força física para sair. Aqueles que participam de roubos tomam pastilhas misturadas com álcool que os deixam violentos, e eles são manipulados pela polícia". "Com o paco, a insegurança atinge sobretudo os pobres", observa Vilma.

"O paco é uma droga de extermínio", diz José Granero, do Programa pela Prevenção e Luta contra o Narcotráfico. A droga é um fenômeno relativamente recente na Argentina. "Agora, não é mais um país de trânsito para a Europa, é um país de consumo e produção", avalia Diana Maffia, deputada de centro-esquerda.

"As Mães contra o paco" são constantemente ameaçadas. Isabel Vázquez, presidente da associação em Lomas de Zamora (província de Buenos Aires), denunciou a cumplicidade da polícia com os traficantes. Ela também questiona os políticos. Em 25 de fevereiro, seu filho Emmanuel foi morto a tiros. Aos 27 anos, ele havia conseguido abandonar o paco. Ele tinha até mesmo encontrado um trabalho.

Tradução: Lana Lim

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