sábado, 28 de julho de 2012

O que define a classe média :: Moreira Franco e Ricardo Paes de Barros

Brasília, seg, 09-07-2012
Para formular políticas públicas, que é a missão da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE/PR), é preciso conhecer detalhadamente a realidade sobre a qual queremos agir. Por isso, para propor políticas que atendam à realidade atual da classe média brasileira é necessário defini-la com clareza. Nossas conclusões baseiam-se em estudos criteriosos, apresentados e validados por técnicos e conceituados membros de nossa academia.
Na última década, a distribuição de renda no Brasil passou por transformações extremamente marcantes. Cerca de 15% da população – 30 milhões de pessoas que viviam em famílias com renda per capita abaixo de R$ 250 – passaram a viver com rendimentos maiores. Por isso o desenho e o acompanhamento das políticas públicas não podiam mais se limitar a definições dirigidas apenas às linhas de extrema pobreza e pobreza. Há um novo segmento a ser atendido e que, segundo projeções feitas para este ano, pode chegar a 54% da população brasileira.
Nosso objetivo é oferecer aos governos uma estratificação da população brasileira que permita a formulação de políticas adequadas às demandas de cada grupo social. Sabemos que as pessoas em diferentes classes de renda têm necessidades, atitudes, comportamentos, oportunidades, aspirações, percepções e desejos distintos. Era preciso, pois, definir essas diferentes classes de renda, em mais do que três segmentos, para melhor caracterizar sua diversidade. Assim, optamos em ter três segmentos de classe baixa, três de classe média e dois de classe alta.
As políticas não podem mais se limitar a definições dirigidas às linhas de extrema pobreza e pobreza
Existem pelo menos três alternativas que buscam divisões da população vinculadas a diferenças de comportamento, oportunidades ou percepções. A primeira é observar como as famílias utilizam sua renda, buscando dividir a população por semelhanças como consumidores, baseando-se no comportamento. A segunda visão é como a renda das famílias é gerada, buscando similaridade nas oportunidades. Por fim, tem-se a visão que reparte as famílias por suas perspectivas sobre o nível de renda futuro. Nesse caso, é privilegiada uma repartição baseada na homogeneidade de anseios, receios e expectativas para o futuro.
Embora a classe média se diferencie dos mais pobres e da classe alta por seu padrão de consumo, mais balanceado entre necessidades e bens supérfluos, talvez sua diferença mais marcante seja a perspectiva que tem para o futuro. Os pobres veem grandes chances de continuarem pobres. Já os não muito acima da linha de pobreza temem voltar a ser pobres. Por isso adotam padrões de consumo, inserções no mercado de trabalho e estratégias de sobrevivência defensivas.
Os que já alcançaram nível de renda suficientemente acima da linha de pobreza é que se sentem naturalmente seguros de que não mais serão pobres. A partir desse nível de renda as famílias começam a visualizar e buscar com perseverança caminhos de ascensão social e, daí, a planejar com atenção seu futuro e realizar significativos investimentos que promovem uma inserção mais qualificada no mundo do trabalho para os membros adultos e maior investimento no desenvolvimento das crianças, adolescentes e jovens. Assim, a linha divisória entre a busca pela sobrevivência e a busca pela ascensão social surge naturalmente como ponto de início para a classe média.
Portanto, calculamos para cada nível de renda seu grau de vulnerabilidade – a chance que uma família teria de permanecer, voltar ou se tornar pobre em algum momento no futuro imediato de cinco anos. Obtidas as estimativas, dividimos a população em grupos homogêneos quanto ao grau de vulnerabilidade. Por esse critério, o início da classe média se daria quando uma família alcançasse uma renda per capita de R$ 291, com a classe alta iniciando-se quando a renda familiar per capita alcança R$ 1.019.
Utilizando o mesmo critério, dividimos a classe média em três segmentos. O segmento chamado de baixa classe média une as famílias com renda per capita entre R$ 291 e R$ 441, o que representa 18% da população brasileira em 2012. O segmento chamado de alta classe média soma as famílias com renda per capita entre R$ 641 e os já definidos R$ 1.019, que representam 17% da população. Por fim, o segmento intermediário reúne as pessoas em famílias com renda per capita entre R$ 441 e R$ 641, 19% da população brasileira.
Parece haver amplo entendimento no país de que mais da metade da população brasileira já pertence à classe média e de que menos de 30% estão abaixo dela. A definição proposta corrobora essas expectativas. Segundo ela, a classe baixa reuniria 26% da população brasileira, a média 54% e a alta 20%.
Os nossos estudos não esgotam a discussão sobre o tema. A ideia é manter a interlocução com especialistas, com o mundo acadêmico e com os institutos de pesquisa sobre o assunto. Em recente reunião com representantes desses institutos em São Paulo, cada um apresentou sua categorização das classes ou grupos sociais. Essas visões se sustentam teoricamente e fornecem possibilidades de aplicações em pesquisas de opinião, decisões de investimentos, planejamentos de produção ou planos mercadológicos de acordo com suas especificidades. Cada uma tem a sua utilidade e, assim, uma não exclui a outra. Poderão, e é o que certamente ocorre, atender a demandas em conformidade com o que oferecem. Entendemos que a conceituação da SAE/PR é a visão que melhor atende à elaboração de políticas públicas.

http://www.sae.gov.br/

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